As fake news podem ser minimizadas se não terceirizarmos a curadoria da informação

Num ambiente de profundo antagonismo de opiniões, recorrentemente ambos os lados se utilizam de argumentos sobre a divulgação de notícias falsas (fake news). Há outras opções de tradução do fake news, tais como: “notícia mentirosa”, “invenção”, “falácia”, “calúnia” entre outros.

A questão que este artigo tem a intenção de colocar uma lente de aumento é a pertinência (ou não) em rotular determinada notícia ou pensamento como mentiroso. Pois parece que ficou fácil demais dizer que trata-se de fake news.

Daí surge os órgãos de curadoria e censura para avaliar se trata-se de fake news legítima ou não. Todo o problema reside nesta intenção, nesta presunção de distinguir o joio do trigo.

O que determina uma FAKE NEWS

A princípio, parece bem simples distinguir um fato de uma mentira. Mas o que se constata é que, na prática, a coisa fica bem mais subjetiva do que parece.

Temos a impressão, errônea, de que se trata de argumentação simples distinguir verdade de mentira. O que fazer com alguém que diz que determinada cor é verde quando, em realidade verificável, se trata de azul. É mentira (fake news) chamar de verde algo que, na verdade, é azul? Sem muita dificuldade.

Mas o problema aparece quando as afirmações não são tão verificáveis ou que, pelo menos, podem gerar sérias controvérsias. Por exemplo: a frase “Lula foi absolvido de suas condenações pela Suprema Corte do Brasil” é verdade ou é fake news?

Agora você leitor deve estar, ou defendendo se tratar de uma fake news inconteste (49,10% dos eleitores de 30/10/2022), pois ele não foi absolvido. Ou pode estar defendendo a frase como verdadeira por ser um fato assim considerado pela Suprema Corte (50,90% dos eleitores de 30/10/2022).

Qual o critério legítimo para esta análise? O critério seria maioria simples ou absoluta (50% +1) do quórum presente ou do quórum total respectivamente? Ou seria maior de 2/3 ou 3/5 do quórum presente ou do quórum total?

Será que a simples opinião de alguém ou a medição da quantidade de pessoas que pendem para um lado, ou outro, seria um bom critério? Me parece que não, certo?

Mas, infelizmente, parece ser exatamente isto que tem acontecido. Para explicar este fenômeno, ou esta dúvida de rótulo de fake news ou não (para dizer o mínimo) precisamos de mais conceitos.

Recorre-se a termos como curadoria e até censura, como forma de definir a questão e colocar um ponto final que pode deixar indignado ambos os lados, dependendo da deliberação adotada.

O que é CURADORIA?

Parece que tem conexão com o ato de “curar”. Está relacionado com o zelo, cuidado e atenção com alguma coisa. Etimologicamente, a palavra curadoria tem origem do latim “curator”, que quer dizer “aquele que administra”, “aquele que tem cuidado e apreço”. Desempenha o papel de tutoria, de cuidar, preservar uma idéia original.

De acordo com Mark Rosenberg existem 11 elementos que podem ser considerados em um processo de curadoria, a saber:

  • Acurácia: o conteúdo precisa estar correto e testado.
  • Autenticidade: o conteúdo precisa ser original.
  • Credibilidade: o conteúdo precisa vir de uma fonte confiável e segura.
  • Compreensão: o conteúdo precisa ser completo, claro e didático em sua abordagem.
  • Suficiência: o conteúdo precisa ser na medida certa. Nem pouco, nem em excesso.
  • Sem viés: o conteúdo deve evitar vieses de pensamento e promover múltiplas visões.
  • Relevante: o conteúdo precisa ser priorizado.
  • Conveniência: o conteúdo precisa ser fácil de encontrar, de aprender e de usar.
  • Sinergia: o conteúdo deve somar com os demais existentes e evitar conflitos.
  • Proteção: o conteúdo pode estar protegido, zelando por sua autoria.
  • Validade: o conteúdo precisa de um plano de expiração.

 

Mas a pergunta que não quer calar é: para quem tudo isto “cara pálida”?! Todas as respostas para as questões acima requer interpretação subjetiva e que se submeterá ao Modelo Mental (clique aqui e saiba mais) vigente de quem fará tal interpretação. Portanto insuficiente para cravar uma interpretação incontestável de fake news ou não.

O que é CENSURA?

Censura (do latim censura) é a desaprovação e consequente remoção da circulação pública de determinada informação, visando à proteção dos interesses de um estado, organização ou indivíduo.

Ela consiste em toda e qualquer iniciativa de suprimir a circulação de informações, opiniões ou expressões de quaisquer natureza. Seus sinônimos são: proibição, cerceamento, repressão, repreensão, advertência, pito, entre muitos outros.

De maneira análoga, para se operacionalizar a censura é fundamental que se faça algum tipo de curadoria, caso contrário, qualquer interpretação seria impossível de ser operacionalizada.

No Brasil a palavra censura é conectada a época da ditadura militar. Regime instaurado no Brasil em 01/04/1964 e que durou até 15/03/1985, sob comando de sucessivos governos militares. Devido a isto, a censura é amplamente criticada e considerada um retrocesso aos direitos humanos.

Sua expressão inversa é liberdade de expressão, assegurada pela Constituição de 1988, que está ligada ao direito de manifestação do pensamento, possibilidade do indivíduo emitir suas opiniões e ideias ou expressar atividades intelectuais, artísticas, científicas e de comunicação, sem interferência ou eventual retaliação do governo.

Como evitar cair nas FAKE NEWS

Para mim, o principal erro é eleger quaisquer representantes para substituir o cidadão no exercício da atividade de curadoria, que nada mais é do que uma fase anterior a censura, que nunca deveria ser adotada.

A liberdade de expressão é, ou deveria ser, sagrada. Embora seja ainda debatido qual o limite para o que se fala? Qual o limite para a expressão de uma ideia? Será que este limite realmente deve existir?

Ao menos no papel, a liberdade de expressão é plena. Cada cidadão pode manifestar quaisquer ideias, por mais absurdas e estúpidas que sejam, dentre as quais até a supressão do regime democrático e da própria liberdade de expressão ou ainda de preferir regimes simpáticos ao extermínio de raças.

Não obstante, se defende muito que a tal da liberdade de expressão termina quando começa a do outro e este limite é permeado de debates extenuantes que sempre serão dignos de leitura e reflexão. Uma jurisprudência se constata de limite desta liberdade de expressão quando se incita o ódio, a violência, a agressão e a desordem.

Portanto não pretendo aqui responder se o LULA foi ou não absolvido de suas condenações pela Suprema Corte do Brasil. Tenho até a minha visão clara sobre o assunto, mas responder isto seria a antítese de meu artigo.

Posso, no máximo, listar meus argumentos para defender um dos lados da resposta. Mas a interpretação final dependerá sempre de VOCÊ, de forma indelegável, assumir para si mesmo a pesquisa das fontes, de preferência originais, sem interpretações de ninguém, para exercitar a curadoria sem substitutos, e subordinada a seus próprios valores e princípios.

O que vejo abundantemente, são pessoas com opinião formada sem quaisquer processos de curadoria pessoal. Simplesmente aderem a opiniões dos outros que sequer foram submetidas a reflexão decorrente de alguma curadoria. Uma preguiça intelectual que acaba nos levando a decisões que podem ser responsáveis por caos difíceis de serem solucionados.

Adm. M. Sc. Orlando Pavani Júnior