A sinfonia das organizações
Ultimamente é muito comum encontrarmos diversos autores comparando a estrutura das organizações com a estrutura de uma orquestra sinfônica. Cada vez mais, esse tipo de dialética tem se mostrado útil no que tange a reflexão sobre as relações de diferentes processos na confecção de um mesmo objetivo.
Assim como nas organizações, a orquestra é dividida em diferentes naipes orquestrais (cordas, madeiras, metais e percussão). Cada naipe possui uma quantidade variada de instrumentos diferentes (no naipe das cordas encontramos violinos, violas, violoncelos e contra-baixos) e cada instrumentista possui um papel único no processo, o qual, somado aos demais, contribui de forma significativa para o resultado final.
No entanto, acredito que podemos tirar mais proveito dessa relação do que apenas essas comparações meramente técnicas. A postura adotada por uma orquestra frente às inovações artísticas no campo da música erudita, por exemplo, pode ilustrar um aspecto interessante sobre as atitudes de uma empresa frente às novidades.
Dessa forma, trataremos aqui de uma analogia entre os treinamentos de alto- impacto (uma novidade no mundo empresarial) e o processo artístico de uma orquestra.
Para ilustrar melhor o que isso significa, vamos dar um exemplo mais próximo do nosso cotidiano. No início da década de 90 o mundo experimentava o princípio de uma invasão digital nos lares ao redor do globo. Invasão essa muitas vezes desacreditada: se sobrevivemos até agora sem os computadores, por que razão haveríamos de nos adaptar a um instrumento tão complexo?
Esse pensamento dividiu a opinião pública e muitas pessoas decidiram que não precisavam disso, permanecendo assim no “velho modo de fazer as coisas”. Hoje, pouco mais de quinze anos depois, é quase impossível sobreviver ao mercado sem conhecimentos básicos de informática. Uma quantidade considerável de negócios é selada via correio eletrônico (e-mail). O mercado on-line se tornou uma opção viável e mais econômica. A invasão ocorreu com muito mais velocidade e ferocidade do que fomos capazes de imaginar, fazendo com que aqueles que não apostaram nela se sintam perdidos num mundo desconhecido.
Esse processo serve como exemplo para analisarmos alguns aspectos do mundo onde vivemos. Ele não ocorreu só na área da informática, mas em toda a sociedade (inclusive nas artes), num período de tempo assustadoramente curto. É muito comum, hoje, analisarmos esses eventos dizendo que é tudo fruto da globalização, nos preocupando em tomarmos conhecimento das transformações a nossa volta.
No entanto, a maior transformação gerada por esse fenômeno não pode ser percebida pelos olhos.
Se tomarmos como exemplo a história das artes no século XX, perceberemos um fato interessante que podemos transportar para usarmos como alegoria no mundo empresarial.
No auge do pós-guerra, muitos artistas foram pioneiros numa arte dita “moderna”. Essa arte também gerou tumultos em seu processo, criando polêmicas quanto à definição do conceito “arte”. Afinal, um quadro em branco, uma música feita com ruídos e uma dança sem música eram coisas extremamente “fáceis” de se fazer e qualquer um poderia fazê-las.
Assim, descobrimos que o conceito de arte, para alguns conservadores, estava ligado até então com a dificuldade na elaboração e confecção do objeto artístico. E a resposta a essas críticas pode ter sido: qualquer um pode fazê-las, mas ninguém faz. É preciso entender que a mudança do conceito é muito mais importante do que o resultado físico e palpável que ela gera, pois o conceito ultrapassa o tempo, o conceito cria.
Como manter o foco nas organizações?
Da mesma forma, atualmente, o cenário corporativo é bombardeado por novas práticas e entre elas estão os treinamentos de alto impacto. As empresas têm se empenhado bastante em preparar sua força de trabalho para as mudanças inevitáveis, com uma preocupação cada vez maior com treinamentos motivacionais e coisas do gênero.
E esse tema, como não poderia deixar de ser, gera conflitos de opiniões. Existe ainda um grupo de pessoas que se defende dizendo: “nesses treinamentos de alto impacto você abraça, chora, grita… Mas, depois de cinco dias tudo volta ao normal”. Eu diria que essa postura seria o mesmo que um cidadão comprar uma Ferrari nova, sair da concessionária, passar no farol vermelho, bater num poste e culpar o carro!
As ferramentas não são e nem podem ser, assim como na arte, o foco! Como definir, então, a importância desse tipo de treinamento no mundo corporativo?
Voltemos para as artes e vejamos um exemplo mais específico. Na década de 60, vários compositores como Karlheinz Stockhausen, Luciano Berio, Pierre Boulez (compositores dos quais alguns ainda não ouviram falar), apostaram numa transformação pungente na música.
A especulação sobre todos os aspectos da composição musical levou a uma expansão de linguagem e pensamento e o tempo mostrou que são as especulações que empurram o progresso.
No entanto, o mundo da música ficou dividido, e permanece dividido até hoje, entre aqueles que apostam numa nova era e os tradicionalistas reacionários. Muitos instrumentistas se recusam a tocar essa nova música, continuando com a execução segura dos clássicos.
O mundo corporativo responde da mesma forma: existem aqueles inertes as mudanças inevitáveis e aqueles pioneiros que se arriscam em busca de novos processos.
Hoje em dia, a música segue o mesmo rumo e temos orquestras especializadas em tocar essa música contemporânea e os músicos que a executam são extremamente valorizados.
Suponhamos então o seguinte: um regente qualquer, com visões revolucionárias e com o espírito voltado para a música de hoje, assume a direção de uma orquestra com músicos que se negaram às mudanças descritas. Aproveitando a conexão moderna que se tem feito comparando uma empresa a uma orquestra sinfônica, transportemos a questão ao mundo empresarial: como fazer com que o colaborador de uma empresa vista uma camisa que o tire da zona de conforto?
99% do trabalho de uma orquestra não está sobre o palco no momento da apresentação. Apenas 1% do sucesso está ligado à concentração dos músicos no ato final. Os outros 99% estão divididos entre o estudo técnico e teórico individual de cada músico, o qual ele pratica há muitos anos, e os ensaios práticos, realizados diariamente.
O regente do caso acima poderia passar horas explicando a esses músicos conservadores a importância do papel da especulação na arte, convencendo-os a abandonar suas convicções mais profundas. Ou poderia fazer, durante os ensaios, que eles se sentissem fazendo parte de um processo renovador.
É no ensaio que o músico tem um contato real com a experiência. É no ensaio que se apara as arestas e se experimenta que o momento final vale a pena. O ensaio prático consiste na parte mais importante do processo. E é justamente aí que reside a diferença: AS CORPORAÇÕES CARECEM DE ENSAIOS PRÁTICOS!
E é com esse foco que os treinamentos de alto impacto atuam: eles simulam, como num ensaio de orquestra, mais do que a tarefa: simulam uma postura. Simulam o acontecimento real, com uma força implacável suficientemente potente para demonstrar à força de trabalho que, acima de tudo, VALE A PENA MUDAR!
Mas as orquestras ensaiam diariamente e as corporações não podem se dar ao luxo de cometer erros nas decisões reais. A questão é, então, colocada: como aplicar as vivências nas dinâmicas com a sua equipe? É por esse motivo que muitas empresas que ministram treinamentos de alto impacto têm mudado (sim, essas empresas também devem passar por mudanças contínuas). Algumas delas oferecem às corporações um acompanhamento regular para não deixar que a “chama se apague”.
Como se fizessem ensaios práticos regulares para renovar a força e não deixar que as pessoas voltem a duvidar de que vale realmente a pena fazer parte do fenômeno de mudanças do mundo. Não podemos mais permitir que não façamos parte disso. O mundo está passando por momentos delicados em várias áreas do pensamento, talvez o mais crítico sejam os problemas ambientais.
Precisamos tomar as rédeas de nossas responsabilidades, assim como o músico entende que ninguém tocará sua parte se ele não o fizer.
Arnold Schoenberg, um dos maiores músicos de todos os tempos, considerado por muitos como pai do pensamento da música moderna, escreveu certa vez: “o movimento, por si só, é capaz de provocar o que a reflexão não conseguiu. Por conseguinte, fica claro que a primeira tarefa do professor é, sem rodeios, sacudir de cima a baixo o aluno. Quando o tumulto originado acalmar-se provavelmente tudo acomodar-se-á em seu (novo) devido lugar”. O problema é que quase sempre se lê essa frase imaginando-se o professor, quando deveríamos todos nos experimentar como os alunos e nos permitir “sacudir” pelas novidades.